sexta-feira, 4 de setembro de 2009

PRIMEIRA CARTA DE PEDRO

PRIMEIRA CARTA DE PEDRO

Esta Carta foi sempre considerada como escrito inspirado e, se não aparece no Cânon de Muratori, será porque este está deteriorado. Aparece escrita pelo Apóstolo Pedro (1,1), por meio de um seu secretário, Silvano (5,12). A crítica bíblica moderna tem chamado a atenção para uma série de dificuldades em admitir a autoria de Pedro, mas sem que elas nos obriguem a ter de procurar outro autor. Vejamos:O seu carácter de discurso exortativo e baptismal não exige que seja um escrito tardio; com efeito, uma Carta do Apóstolo podia ter, logo na origem, um carácter de exortação moral e um fundo que se coadune com uma “homilia baptismal”. Por outro lado, as referências às perseguições não implicam tratar-se das perseguições oficiais dos imperadores romanos, que só nos fins do séc. I se estenderam a todo o império. Finalmente, a elegância e perfeição do grego, assim como as frequentes expressões paulinas, podem dever--se ao secretário utilizado, Silvano (5,12), o mesmo que Silas nos Actos, discípulo e companheiro de Paulo.

DESTINATÁRIOS Os destinatários da Carta são nomeados no início (1,1). Uns pensam que se tratava dos cristãos de toda a Ásia Menor (menos a Cilícia), como parecem indicar as províncias designadas; outros, que seriam apenas as regiões evangelizadas por Paulo.A designação de «os que peregrinam na diáspora» (1,1) é entendida por uns no sentido literal os judeo-cristãos da diáspora e por outros no sentido figurado os cristãos em geral, dispersos por este mundo.
CONTEXTO, LOCAL E DATA A Carta pretende exortar os fiéis a permanecerem firmes na fé, no meio de um ambiente hostil. A sua ocasião é desconhecida; alguns pensam que teria sido a chegada a Roma de notícias de graves dificuldades para a perseverança dos cristãos daquelas regiões, enquanto Paulo andaria pela Espanha.Aparece como enviada a partir da «comunidade dos eleitos que está em Babilónia» (5,13), isto é, de Roma, como esta é designada no Apocalipse; de facto, não podia tratar-se da Babilónia da Mesopotâmia, já destruída, nem da do Egipto, simples guarnição militar.Admitida a autenticidade da Carta, deve datar-se antes da morte de Pedro, o mais tardar, no ano 67.

DIVISÃO E CONTEÚDO A carta encontra-se dividida em 4 secções:Saudação inicial e acção de graças: 1,1-12;I. Exortação à santidade: 1,13-2,10;II. Os cristãos perante o mundo: 2,11-3,12;III. Os cristãos perante o sofrimento: 3,13-4,11;IV. Últimas exortações: 4,12-5,14.Estamos perante um escrito da segunda geração cristã que pretende animar a fé dos que já tinham desanimado na sua caminhada na Igreja.

1 Saudação inicial - 1Pedro, Apóstolo de Jesus Cristo, aos que peregrinam na diáspora do Ponto, da Galácia, da Capadócia, da Ásia e da Bitínia, eleitos 2por meio da santificação do Espírito, segundo a providência de Deus Pai, para obedecerem a Jesus Cristo e receberem a aspersão do seu sangue. Graça e paz vos sejam dadas em abundância.
Louvor a Deus pela vocação cristã 3Bendito seja Deus,Pai do Nosso Senhor Jesus Cristo,que na sua grande misericórdianos gerou de novo- através da ressurreição de Jesus Cristo dentre os mortos -para uma esperança viva, 4para uma herança incorruptível,imaculada e indefectível,reservada no Céu para vós, 5a quem o poder de Deus guarda, pela fé,até alcançardes a salvação que está prontapara se manifestar no momento final. 6É por isso que exultais de alegria, se bem que, por algum tempo, tenhais de andar aflitos por diversas provações; 7deste modo, a qualidade genuína da vossa fé - muito mais preciosa do que o ouro perecível, por certo também provado pelo fogo - será achada digna de louvor, de glória e de honra, na altura da manifestação de Jesus Cristo. 8Sem o terdes visto, vós o amais; sem o ver ainda, credes nele e vos alegrais com uma alegria indescritível e irradiante, 9alcançando assim a meta da vossa fé: a salvação das almas. 10Esta salvação foi objecto das buscas e averiguações dos profetas, que predisseram a graça que vos estava destinada. 11Eles investigavam a época e as circunstâncias indicadas pelo Espírito de Cristo, que neles morava e que profetizava os padecimentos reservados a Cristo e a glória que se lhes seguiria. 12Foi-lhes revelado - não para seu proveito, mas para vosso - que eles estavam ao serviço destas realidades que agora vos foram anunciadas por aqueles que vos pregaram o Evangelho, em virtude do Espírito Santo enviado do Céu; as mesmas que os Anjos avidamente contemplam.

I. EXORTAÇÃO À SANTIDADE(1,13-2,10)
Dignidade da vida cristã - 13Por isso, de ânimo preparado para servir e vivendo com sobriedade, ponde a vossa esperança na dádiva que vos vai ser concedida com a manifestação de Jesus Cristo. 14Como filhos obedientes, não vos conformeis com os antigos desejos do tempo da vossa ignorância; 15mas, assim como é santo aquele que vos chamou, sede santos, vós também, em todo o vosso proceder, 16conforme diz a Escritura:Sede santos, porque Eu sou santo. 17E, se invocais como Pai aquele que, sem parcialidade, julga cada um consoante as suas obras, comportai-vos com temor durante o tempo da vossa peregrinação; 18sabendo que fostes resgatados da vossa vã maneira de viver herdada dos vossos pais, não a preço de bens corruptíveis, prata ou ouro, 19mas pelo sangue precioso de Cristo, qual cordeiro sem defeito nem mancha, 20predestinado já antes da criação do mundo e manifestado nos últimos tempos por causa de vós; 21vós, que por meio dele tendes a fé em Deus, que o ressuscitou dos mortos e o glorificou, a fim de que a vossa fé e a vossa esperança estejam postas em Deus.
O amor fraterno - 22Já que purificastes as vossas almas pela obediência à verdade que leva a um sincero amor fraterno, amai-vos intensamente uns aos outros do fundo do coração, 23como quem nasceu de novo, não de uma semente corruptível, mas de um germe incorruptível, a saber, por meio da palavra de Deus, viva e perene. 24De facto,todo o mortal é como a ervae toda a sua glória como a flor da erva.Seca-se a erva e cai a flor, 25mas a palavra do Senhor permanece para sempre.Esta é a palavra que vos foi anunciada como boa-nova.
2 Como crianças recém-nascidas - 1Portanto, ponde de parte toda a malícia, falsidades, hipocrisias, invejas e toda a espécie de maledicências; 2como crianças recém-nascidas, ansiai pelo leite espiritual, não adulterado, para que ele vos faça crescer para a salvação, 3se é que já saboreastes como o Senhor é bom.

Cristo, pedra angular - 4Aproximando-vos dele, pedra viva, rejeitada pelos homens, mas escolhida e preciosa aos olhos de Deus, 5também vós - como pedras vivas - entrais na construção de um edifício espiritual, em função de um sacerdócio santo, cujo fim é oferecer sacrifícios espirituais agradáveis a Deus, por Jesus Cristo. 6Por isso se diz na Escritura:Eis que ponho em Sião uma pedra angular, escolhida, preciosa;quem crer nela não será confundido. 7A honra é, então, para vós, os crentes; mas, para os incrédulos,a pedra que os construtores rejeitaram,esta mesma tornou-se a pedra angular, 8e também uma pedra que faz tropeçar,uma pedra de escândalo.Tropeçam nela porque não creram na palavra; para isso estavam destinados. 9Vós, porém, sois linhagem escolhida, sacerdócio régio, nação santa, povo adquirido em propriedade, a fim de proclamardes as maravilhas daquele que vos chamou das trevas para a sua luz admirável; 10a vós que outrora não éreis um povo, mas sois agora povo de Deus, vós que não tínheis alcançado misericórdia e agora alcançastes misericórdia.

II. OS CRISTÃOS PERANTE O MUNDO (2,11-3,12)
Exortação inicial - 11Caríssimos, rogo-vos que, como estrangeiros e peregrinos, vos abstenhais dos desejos carnais, que combatem contra a alma. 12Tende entre os gentios um comportamento exemplar, de modo que, ao acusarem-vos de malfeitores, vendo as vossas boas obras, acabem por dar glória a Deus no dia da sua visita.

Obediência às autoridades (Rm 13,1-7; Tt 3,1-7) - 13Sede, pois, submissos a toda a instituição humana, por amor do Senhor; quer ao rei, como soberano, 14quer aos governadores, como enviados por ele para punir os malfeitores e honrar os que fazem o bem. 15Pois é esta a vontade de Deus: que, praticando o bem, façais emudecer a ignorância dos insensatos. 16Actuai como homens livres, não como aqueles que fazem da liberdade um pretexto para a maldade, mas como servos de Deus. 17Respeitai a todos, amai os irmãos, temei a Deus, honrai o rei.

Obediência dos escravos (1 Tm 6,1-2; Tt 2,9-14) - 18Vós, servos, sede obedientes com todo o respeito aos vossos senhores, não só aos bons e compreensivos, mas também aos severos. 19Pois é meritório suportar contrariedades em atenção a Deus, sofrendo injustamente. 20Aliás, que mérito tem suportar que vos batam, se vos portais mal? Mas se, fazendo o bem, sofreis com paciência, isso é uma coisa meritória diante de Deus. 21Ora, foi para isto que fostes chamados; visto queCristo também padeceu por vós,deixando-vos o exemplo,para que sigais os seus passos. 22Ele não cometeu pecado,nem na sua boca se encontrou engano; 23ao ser insultado, não respondia com insultos;ao ser maltratado, não ameaçava,mas entregava-se àquele que julga com justiça; 24subindo ao madeiro,Ele levou os nossos pecados no seu corpo,para que, mortos para o pecado,vivamos para a justiça:pelas suas chagas fostes curados. 25Na verdade, éreis como ovelhas desgarradas,mas agora voltastes ao Pastore Guarda das vossas almas.

3 Deveres dos esposos (Ef 5,21-33) 1Vós, também, ó mulheres, sede submissas aos vossos maridos, para que, mesmo se alguns não crêem na Palavra, venham a ser conquistados, sem palavras, pelo procedimento das suas mulheres, 2ao observarem a vossa conduta casta e cheia de respeito. 3Que o vosso adorno não seja o exterior - arranjo do cabelo, jóias de ouro, roupa vistosa - 4mas, sim, o interior, que está oculto no coração, o adorno duradouro de uma alma mansa e serena; este é o adorno de maior valor aos olhos de Deus. 5Era assim que outrora se adornavam as santas mulheres que esperavam em Deus, submissas a seus maridos; 6assim, Sara que obedecia a Abraão, chamando-lhe seu senhor. Dela vós sois filhas, quando fazeis o bem, sem vos deixardes perturbar por nenhum temor. 7Do mesmo modo, vós, maridos, no convívio com as vossas mulheres, tende em conta que são de natureza mais delicada, e tende consideração por elas, dado que são também herdeiras convosco do dom da vida. Assim, nada estorvará a vossa oração.

O amor fraterno - 8Finalmente, tende todos o mesmo pensar e os mesmos sentimentos, o amor de irmãos, a misericórdia e a humildade. 9Não pagueis o mal com o mal, nem a injúria com a injúria; pelo contrário, respondei com palavras de bênção, pois a isto fostes chamados: a herdar uma bênção. 10Pois quem quer ter amor à vidae ver dias felizes,refreie a sua língua do male os seus lábios de palavras enganosas; 11aparte-se do mal e pratique o bem,busque a paz e corra atrás dela. 12Porque os olhos do Senhor fixam-se nos justose os ouvidos do Senhor estão atentos às suas súplicas;mas o seu rosto volta-se contra os que fazem o mal.

III. OS CRISTÃOS PERANTE O SOFRIMENTO (3,13-4,11)
Os que sofrem injustamente - 13E quem vos poderá fazer mal, se fordes zelosos em praticar o bem? 14Mas, se tiverdes de padecer por causa da justiça, felizes de vós!Não temais as suas ameaças, nem vos deixeis perturbar; 15mas, no íntimo do vosso coração, confessai Cristo como Senhor, sempre dispostos a dar a razão da vossa esperança a todo aquele que vo-la peça; 16com mansidão e respeito, mantende limpa a consciência, de modo que os que caluniam a vossa boa conduta em Cristo sejam confundidos, naquilo mesmo em que dizem mal de vós. 17Melhor é padecer por fazer o bem, se é essa a vontade de Deus, do que por fazer o mal.
Sofrimento e glória de Cristo 18Também Cristo padeceu pelos pecados,de uma vez para sempre- o Justo pelos injustos para nos conduzir a Deus.Morto na carne, mas vivificado no espírito. 19Foi então que foi pregar também aos espíritos cativos, 20outrora incrédulos, no tempo em que, nos dias de Noé, Deus os esperava pacientemente enquanto se construía a Arca; nela poucas pessoas - oito apenas - se salvaram por meio da água. 21Isto era uma figura do baptismo, que agora vos salva, não por limpar impurezas do corpo, mas pelo compromisso com Deus de uma consciência honrada, em virtude da ressurreição de Jesus Cristo, 22que, tendo subido ao Céu, está sentado à direita de Deus, e a Ele se submeteram Anjos, Dominações e Potestades.

4 Luta contra o pecado - 1Posto que Cristo padeceu na sua carne, preparai-vos, também vós, para a luta, com esta consideração: quem padeceu na carne rompeu com o pecado, 2a fim de viver, durante o tempo que lhe resta da sua vida mortal, não já segundo as paixões humanas, mas segundo a vontade de Deus. 3Já basta que, no tempo passado, tenhais procedido à maneira dos pagãos, vivendo em devassidão, paixões desonestas, embriaguez, excessos no comer e no beber e em nefandos cultos de falsos deuses. 4Por isso, eles estranham agora que não os acompanheis nos mesmos desregramentos de libertinagem e cobrem-vos de insultos. 5Mas prestarão contas àquele que está pronto para julgar os vivos e os mortos. 6Pois para isto foi o Evangelho também pregado aos mortos; a fim de que, muito embora condenados na sua vida corporal segundo o juízo dos homens, vivam, contudo, em espírito segundo o juízo de Deus.
Apelo à virtude - 7Ora, o fim de todas as coisas está próximo. Sede, portanto, sensatos e sóbrios para vos poderdes dedicar à oração. 8Acima de tudo, mantende entre vós uma intensa caridade, porque o amor cobre a multidão dos pecados. 9Exercei a hospitalidade uns com os outros, sem queixas. 10Como bons administradores das várias graças de Deus, cada um de vós ponha ao serviço dos outros o dom que recebeu. 11Se alguém tomar a palavra, que seja para transmitir palavras de Deus; se alguém exerce um ministério, faça-o com a força que Deus lhe concede, para que em todas as coisas Deus seja glorificado por Jesus Cristo. A Ele a glória e o poder por todos os séculos dos séculos. Ámen.

IV. ÚLTIMAS EXORTAÇÕES (4,12-5,14)
Alegria na perseguição - 12Caríssimos, não estranheis a fogueira que se ateou no meio de vós para vos pôr à prova, como se vos acontecesse alguma coisa estranha. 13Pelo contrário, alegrai-vos, pois assim como participais dos padecimentos de Cristo, assim também rejubilareis de alegria na altura da revelação da sua glória. 14Se sois ultrajados pelo nome de Cristo, bem-aventurados sois vós, porque o espírito da glória, o Espírito de Deus, repousa sobre vós. 15Que nenhum de vós tenha de sofrer por ser homicida, ladrão, malfeitor, ou por se intrometer na vida alheia. 16Mas, se sofre por ser cristão, não se envergonhe, antes glorifique a Deus por ter este nome. 17É tempo de começar o julgamento pela casa de Deus; e, se começa por nós, qual será a sorte dos que não crêem no Evangelho de Deus? 18E,se o justo dificilmente se salva,o que virá a ser do ímpio e do pecador? 19Por isso, aqueles que tenham de sofrer segundo a vontade de Deus, encomendem as suas almas ao Criador, que é fiel, perseverando na prática do bem.
5 Exortação aos pastores - 1Aos presbíteros que há entre vós, eu - presbítero como eles e que fui testemunha dos padecimentos de Cristo e também participante da glória que se há-de manifestar - dirijo-vos esta exortação: 2Apascentai o rebanho de Deus que vos foi confiado, governando-o não à força, mas de boa vontade, tal como Deus quer; não por um mesquinho espírito de lucro, mas com zelo; 3não com um poder autoritário sobre a herança do Senhor, mas como modelos do rebanho. 4E, quando o supremo Pastor se manifestar, então recebereis a coroa imperecível da glória.

Exortação aos fiéis - 5Igualmente, vós, jovens, sede submissos aos presbíteros; e revesti-vos todos de humildade no trato uns com os outros, porque Deus opõe-se aos soberbos, mas dá a sua graça aos humildes. 6Humilhai-vos, pois, debaixo da poderosa mão de Deus, para que Ele vos exalte no devido tempo. 7Confiai-lhe todas as vossas preocupações, porque Ele tem cuidado de vós. 8Sede sóbrios e vigiai, pois o vosso adversário, o diabo, como um leão a rugir, anda a rondar-vos, procurando a quem devorar. 9Resisti-lhe, firmes na fé, sabendo que a vossa comunidade de irmãos, espalhada pelo mundo, suporta os mesmos padecimentos. 10Depois de terdes padecido por um pouco de tempo, o Deus que é todo graça e vos chamou em Jesus Cristo à sua eterna glória, há-de restabelecer-vos e consolidar-vos, tornar-vos firmes e fortes. 11Para Ele o poder pelos séculos dos séculos. Ámen.

Conclusão - 12Por Silvano, a quem considero um irmão fiel, escrevo-vos estas breves palavras, para vos exortar e para vos assegurar que esta é a verdadeira graça de Deus; perseverai nela! 13Manda-vos saudações a comunidade dos eleitos que está em Babilónia e, em particular, Marcos, meu filho. 14Saudai-vos uns aos outros com um ósculo de irmãos que se amam.Paz a todos vós, que estais em Cristo.

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