sexta-feira, 4 de setembro de 2009

SEGUNDA CARTA DE PEDRO

SEGUNDA CARTA DE PEDRO

O autor desta Carta apresenta-se como «Simão Pedro, servo e Apóstolo de Jesus Cristo» (1,1) e testemunha da Transfiguração de Jesus na montanha (1,16). Não obstante, é o escrito do NT com menos garantias de autenticidade, apesar de Orígenes e São Jerónimo o considerarem autêntico, assim como vários críticos actuais. Mas as dificuldades são de peso. Concretamente: das 700 palavras da 2 Pe apenas umas 100 são comuns à 1 Pe; são raras as citações do AT, ao contrário da 1 Pe; as Cartas paulinas já são consideradas como Escritura (3,15-16), o que pressupõe uma época tardia.Por outro lado, não há inconveniente em pensar que um discípulo anónimo de Pedro, sob a inspiração do Espírito Santo, quisesse transmitir uns ensinamentos em sintonia com os do Apóstolo; ao utilizar o seu nome e a sua autoridade, não fazia mais do que valer-se de um recurso frequente naquela época, a pseudonímia, com a consciência de que as ideias desenvolvidas não eram pessoais, saídas da própria cabeça, mas as do Apóstolo Pedro. Assim, o hipotético redactor da Carta não pretenderia substituir Pedro, mas fazer justiça à autenticidade da mensagem.

DATA E LOCAL Pressupondo a pseudonímia, a Carta poderia ter sido escrita entre os anos 80-90, mas não já em pleno séc. II, como foi proposto por alguns. O local da redacção é desconhecido; poderia ser Roma.
DESTINATÁRIOS Os destinatários não são expressamente referidos; mas são cristãos que conhecem os escritos paulinos (ver 3,13). Pela referência de 3,1 bem poderiam ser os da 1.ª Carta; a não ser que esta alusão não passe de um estratagema para reforçar a possível pseudonímia. Seja como for, a Carta tem um carácter universal.O seu objectivo é denunciar graves erros que ameaçavam a fé e os bons costumes, sobretudo a negação da segunda vinda do Senhor (3,3-4).

DIVISÃO E CONTEÚDO Podemos estruturar 2 Pe do seguinte modo:Saudação: 1,1-2;I. Exortação à perseverança na fé: 1,3-21;II. Denúncia dos falsos mestres: 2,1-22;III. A segunda vinda do Senhor: 3,1-16;Conclusão: 3,17-18.Os temas fundamentais desta Carta são: a segunda vinda do Senhor (1,16), definida como misericordiosa (3,4.8-10.15), mas que vai trazer uma mudança radical no cosmos; a lembrança da Transfiguração (1,16-19); a inspiração das Escrituras (1,20-21; 3,14-16); a importância do «conhecimento» religioso (1,2-8; 2,20; 3,1).Tudo indica que esta Carta é o desenvolvimento da Carta de Judas, sobretudo em 2,1-18; 3,1-13, onde recolhe a temática de Jd 4-19. Por isso mesmo, seria mais tardia que esta. Nas duas se combatem os falsos mestres.

1 Saudação - 1Simão Pedro, servo e Apóstolo de Jesus Cristo, àqueles a quem coube em sorte, pela justiça do nosso Deus e Salvador Jesus Cristo, uma fé tão preciosa como a nossa: 2graça e paz vos sejam concedidas em abundância por meio do conhecimento de Deus e de Jesus, Senhor nosso.

I. EXORTAÇÃO À PERSEVERANÇA NA FÉ (1,3-21)
Dons recebidos de Deus - 3O divino poder, ao dar-nos a conhecer aquele que nos chamou pela sua glória e pelo seu poder, concedeu-nos todas as coisas que contribuem para a vida e a piedade. 4Com elas, teve a bondade de nos dar também os mais preciosos e sublimes bens prometidos, a fim de que - por meio deles - vos torneis participantes da natureza divina, depois de vos livrardes da corrupção que a concupiscência gerou no mundo. 5Por este motivo é que, da vossa parte, deveis pôr todo o empenho em juntar à vossa fé a virtude; à virtude o conhecimento; 6ao conhecimento a temperança; à temperança a paciência; à paciência a piedade; 7à piedade o amor aos irmãos; e ao amor aos irmãos a caridade. 8Se tiverdes estas virtudes e elas forem crescendo em vós, não ficareis inactivos nem estéreis, relativamente ao conhecimento de Nosso Senhor Jesus Cristo. 9E quem não tiver estas virtudes é um cego que mal pode ver e que deixou cair no esquecimento a purificação dos seus pecados de outrora. 10Por isso, meus irmãos, ponde o maior empenho no fortalecimento da vossa vocação e eleição. Se assim procederdes, jamais haveis de fracassar 11e se vos há-de abrir de par em par a entrada para o reino eterno de Nosso Senhor e Salvador, Jesus Cristo.

Garantias do testemunho apostólico - 12Eis por que sempre procurarei lembrar-vos estas coisas, por mais instruídos e firmes que estejais na verdade que já conheceis. 13É que tenho por meu dever - enquanto estiver nesta tenda - manter-vos alerta com os meus avisos, 14pois sei que em breve terei de deixá-la, conforme Nosso Senhor Jesus Cristo mo deu a conhecer. 15E cuidarei de que, mesmo depois da minha partida, possais conservar sempre a lembrança destas coisas. 16De facto, demo-vos a conhecer o poder e a vinda de Nosso Senhor Jesus Cristo, não por havermos ido atrás de fábulas engenhosas, mas por termos sido testemunhas oculares da sua majestade. 17Com efeito, Ele foi honrado e glorificado por Deus Pai, quando a excelsa Glória lhe dirigiu esta voz:Este é o meu Filho, o meu muito Amado,em quem Eu pus o meu encanto. 18E esta voz, vinda do Céu, nós mesmos a ouvimos quando estávamos com Ele na montanha santa. 19E temos assim mais confirmada a palavra dos profetas, à qual fazeis bem em prestar atenção como a uma lâmpada que brilha num lugar escuro, até que o dia desponte e a estrela da manhã nasça nos vossos corações. 20Mas, antes de tudo, tende presente que ninguém pode interpretar por si mesmo uma profecia da Escritura, 21porque jamais uma profecia foi proferida pela vontade de um homem; mas, sendo movidos pelo Espírito Santo é que certos homens falaram da parte de Deus.

II. DENÚNCIA DOS FALSOS MESTRES (2,1-22)
2 Os falsos mestres (Jd 4-19) - 1Assim como houve entre o povo de Israel falsos profetas, assim também haverá entre vós falsos mestres; introduzirão disfarçadamente heresias perniciosas e, indo ao ponto de negar o Senhor que os resgatou, atrairão sobre si mesmos uma rápida perdição. 2Muitos hão-de segui-los na sua libertinagem e, por causa deles, o caminho da verdade será blasfemado; 3movidos pela cobiça, hão-de explorar-vos com palavras enganadoras. Mas a sua condenação há muito que não perde pela demora e a sua ruína não dorme.
Um castigo inevitável - 4Com efeito, Deus não poupou os anjos que pecaram mas, precipitando-os no Inferno, entregou-os a um fosso de trevas, onde estão reservados para o Juízo; 5e não poupou o mundo antigo, embora tenha preservado oito pessoas, contando Noé, o arauto da rectidão, quando desencadeou o dilúvio sobre o mundo dos ímpios; 6e condenou as cidades de Sodoma e Gomorra à destruição, reduzindo-as a cinzas, para servirem de exemplo aos ímpios que viriam depois; 7mas livrou o justo Lot, deprimido pela vida dissoluta daquela gente depravada, 8pois este justo, morando no meio deles, sentia atormentada a sua alma recta, devido às obras malvadas que via e ouvia, dia após dia. 9É que o Senhor sabe livrar da provação quem é piedoso e reservar os maus para o castigo do dia do juízo, 10principalmente aqueles que correm atrás dos desejos impuros do corpo e desprezam a autoridade do Senhor.
A moral dos falsos mestres - 11Audaciosos e arrogantes, não temem ultrajar seres gloriosos,ao passo que os anjos, superiores em força e poder, não pronunciam um juízo injurioso contra eles, diante do Senhor. 12Estes, porém, semelhantes a animais irracionais, destinados por natureza a serem caçados e mortos, falam mal do que não conhecem e, assim, morrerão como animais, 13sofrendo o mal pelo mal que fizeram.Põem a sua satisfação no gozo de um dia e são homens imundos e corrompidos, que sentem prazer em enganar, enquanto se banqueteiam convosco. 14Os seus olhos estão cheios de adultério e não se fartam de pecar. Seduzem as almas débeis; o seu coração está acostumado à cobiça; são filhos da maldição. 15Abandonaram o caminho recto e extraviaram-se no caminho de Balaão, filho de Bosor que foi atrás do salário da iniquidade, 16mas foi repreendido pela sua desobediência: um jumento mudo, falando com voz humana, deteve a insensatez do profeta. 17Esses são fontes sem água e nuvens agitadas pela tempestade, para quem está reservada a mais tenebrosa escuridão. 18Gritam discursos empolados e vazios e, excitando as paixões carnais e a devassidão, seduzem aqueles que começam a afastar-se dos que vivem no erro. 19Prometem-lhes a liberdade, quando eles próprios são escravos da corrupção, pois é-se escravo daquele por quem nos deixamos vencer.
Gravidade da apostasia - 20Com efeito, se aqueles que fugiram da corrupção do mundo, pelo conhecimento de Jesus Cristo, Nosso Senhor e Salvador, se deixam de novo enredar e vencer por ela, o seu último estado torna-se pior do que o primeiro. 21Melhor lhes fora não ter conhecido o caminho da justiça do que, depois de o conhecer, voltar atrás, abandonando a lei santa que lhes foi transmitida. 22Acontece-lhes o que diz aquele provérbio tão acertado:«O cão volta ao seu vómitoe a porca, acabada de lavar,volta a revolver-se na lama.»

III. A SEGUNDA VINDA DO SENHOR (3,1-16)
3 A doutrina da Fé - 1Caríssimos, esta é a segunda Carta que vos escrevo. Tanto numa como noutra, procuro com as minhas exortações despertar em vós uma correcta maneira de pensar, 2a fim de que vos recordeis das coisas preditas pelos santos profetas e do mandamento do Senhor e Salvador, transmitido pelos vossos Apóstolos.
Erros escatológicos - 3Antes de mais, ficai a saber que, nos últimos dias, hão-de vir uns impostores trocistas, que viverão segundo as suas más paixões e, troçando, 4vos perguntarão: «Em que fica a promessa da sua vinda? Desde que os pais morreram, tudo continua na mesma, como desde o princípio do mundo!» 5Esquecem-se propositadamente de que, noutros tempos, havia uns céus e uma terra que a palavra de Deus tornou firmes a partir da água e no meio das águas; 6e, em virtude destas, o mundo de então pereceu afogado. 7Quanto aos céus e à terra que agora existem, a mesma palavra os tem reservados para o fogo, mantendo-os até ao dia do juízo e da perdição dos ímpios. 8Mas há uma coisa, caríssimos, que não deveis esquecer: um dia para o Senhor é como mil anos, e mil anos, como um só dia. 9Não é que o Senhor tarde em cumprir a sua promessa, como alguns pensam, mas simplesmente usa de paciência para convosco, pois não quer que ninguém pereça, mas que todos se convertam. 10Porém, o Dia do Senhor chegará como um ladrão: os céus desaparecerão com estrondo, os elementos do mundo abrasados dissolver-se-ão, assim como a terra e as obras que nela houver.

Urgência de estar preparados - 11Uma vez que todas as coisas serão assim destruídas, como deve ser santa a vossa vida e a vossa piedade, 12enquanto esperais e apressais a chegada do dia de Deus, quando os céus, a arder, se desintegrarem e os elementos do mundo, com o ardor do fogo, se derreterem! 13Nós, porém, segundo a sua promessa, esperamos uns novos céus e uma nova terra, onde habite a justiça. 14Portanto, caríssimos, enquanto esperais estes acontecimentos, esmerai-vos para que Ele vos encontre imaculados, irrepreensíveis e em paz. 15Considerai que a paciência de Nosso Senhor é para nossa salvação.Nesta ordem de ideias, escreveu-vos também o nosso caríssimo irmão Paulo, segundo a sabedoria que lhe foi concedida. 16E assim fala em todas as Cartas em que trata destes temas; há nelas alguns temas difíceis, que os ignorantes e pouco firmes deturpam - como fazem às restantes Escrituras - para a sua própria perdição.

Conclusão - 17Vós, caríssimos, dado que sabeis isto de antemão, estai alerta para que não venhais a descair da vossa firmeza, arrastados pelo erro desses malvados. 18Crescei, antes, na graça e no conhecimento do Nosso Senhor e Salvador, Jesus Cristo. A Ele seja dada glória, agora e até ao dia eterno. Ámen.

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